quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Resenha de Trail of Cthulhu - 3ª e Última Parte

Continuamos com a resenha do Trail of Cthulhu, agora em sua parte final.


O Mythos

O Capítulo seguinte trata do Mythos, e já começa pelos “Gods and Titans”. Para cada uma das grandes entidades tratadas no livro, há uma citação de obra lovecraftiana sobre ela. Além disto, esta parte do capítulo, tendo em vista a inutilidade de estabelecer características exatas para estas criaturas, bem como a própria opção de Lovecraft em mantê-las misteriosas, não trás mecânicas sobre as mesmas, salvo a perda de Sanity/Stability ligada a cada uma delas.

Para cada uma delas, ao invés de repostas, são dadas várias sugestões do que ela pode representar em sua campanha. Assim, na descrição de Dagon, por exemplo, há sugestões várias, desde ele ser somente um Deep One muito grande, até ele ser um Avatar de Shub-Niggurath, envolvido com as experiências de miscigenação dos Deep Ones.

Vale dizer que neste ponto, em algumas sugestões há referências às controversas interpretações elementais de August Derleth. Porém, além de apresentá-las simplesmente, Hite vai além, e associa alguns destes “deuses elementais” a outras espécies de “elementos”, que não os clássicos, “mas associados às quatro forças fundamentais de nosso espaço-tempo”. Ou seja, há sugestões para todos os gostos, que vão do oculto, até o weird science.

Deixando as entidades, Hite passa aos conhecidos tomos, que fazem a alegria dos fãs do Mythos. O conteúdo dos livros, apesar de embasado em mecânica sólida, é deixado vago, para que uma “passagem esquecida” que o investigador “não atentara até então” possa ser usada como uma pista em uma sessão, ou que de uma hora para outra alguém ache o feitiço necessário, em um livro que já possuía. De modo geral, os tomos funcionam como bônus a serem somados a Abilities específicas, ou como “pontos extras” a serem usados, naquela aventura, para descobrir certo tipo de pista. Por exemplo, o Cultes des Goules dá um ponto extra para qualquer Investigative Ability, desde que usada para investigar ghouls.

Depois dos tomos, temos os feitiços, que são lançados com base na Sanity do investigador (uma regra nova está presente no livro Rough Magics). As magias são baseadas nas obras de Lovecraft e outros, como o Ritual SaaaMaaa de Hodgson. Cada feitiço, além de descrito em sua mecânica, é explicado no contexto do cenário. Meu único problema com esta sessão é que os quase idênticos feitiços de contato com entidades, francamente, poderiam ter sido unificados em uma mecânica única, e deixado os detalhes da invocação para cada Keeper.

Passamos, então, para as raças alienígenas, que são descritas não só mecanicamente, mas também em termos de ambientação. Aqui eu acho que faz muita falta a descrição da criatura indicar de que conto ela veio, como forma de permitir ao Keeper se informar diretamente junto à fonte. Seguindo a lógica de ser um jogo de Investigação, cada uma delas tem uma curta explanação dos tipos de pistas a ela associados. A variedade de criaturas é razoavelmente ampla, e cobre não só as bases principais, e chega ao ponto do obscuro. O que não falta são opções.

Após as raças tipicamente do Mythos, temos descrições de animais e seres do folclore, de forma razoavelmente abrangente. Mesmo que o Keeper não encontre exatamente o monstro/animal que procura, encontrará outro que poderá servir de modelo.

Para completar o capítulo, temos a descrição de oito sociedades secretas, com informações sobre sua história, distribuição geográfica, modus operandi e ganchos para aventuras.

Os Anos 30

Ao contrário de CoC, cuja época default são os anos 20, ToC explora a década seguinte.

O livro tem um capítulo dedicado a ensinar sobre a vida dos anos 30, sem medo de adentrar temas difíceis da obra de Lovecraft, como o racismo e tendências totalitárias.

Aqui Hite fala sobre a pobreza da época, a I Guerra Mundial, a tecnologia, fornece uma curta linha do tempo, e informa dados básicos sobre diversos países, inclusive o Brasil, dando ganchos de aventura onde possível. O capítulo é interessante, mas como eu sou fã de outros jogos que se passam na época, nada me prendeu a atenção, pois pouco vi de novo.

Juntando Tudo

Este capítulo trata de como preparar uma campanha, com conselhos para o Keeper e o Jogador, utilizando todo o material até ali. Como o sistema é pouco ortodoxo, estas dicas ajudam bastante, e mesmo no que se refere a conselhos mais gerais, são de boa qualidade.

Estrutura de Campanhas

Hite sugere três campanhas, para dar um pontapé inicial nas idéias do Keeper: The Armitage Inquiry, um grupo de professores e alunos da universidade Miskatonic que estuda o Mythos; Project Covenant, um projeto abandonado do governo americano, após o ataque à Innsmouth, que permanece vivo não oficialmente; e Book-Hounds of London, que trata sobre o “submundo” dos comerciantes de livros raros em Londres, e o que acontece quando eles encontram certos tipos de livros (a ser transformado em uma campanha oficial que já está sendo escrita).

Para cada campanha, quando necessário, há sugestões de regras opcionais.

The Kingsbury Horror

The Kingsbury Horror é a aventura introdutória que vem no livro básico. Eu não mestrei ou joguei a aventura, então só posso comentar sobre o que li, sem saber exatamente como ela “funciona” em mesa.

A aventura tem como foco os “Torso Murders” que realmente aconteceram em Cleveland, nos anos 30, que consistiram em uma série de assassinatos onde as vítimas foram decapitadas. A aventura tem, é óbvio, uma explicação sobrenatural, mas a conexão com o Mythos é tênue, em minha opinião. Porém, e esse é o grande objetivo de uma aventura introdutória, ensina bem o sistema, pois durante a mesma há vários momentos em que é necessário o seu uso.

Apêndices

O livro conta com quatro apêndices. O primeiro deles são as regras de conversão de CoC para ToC e dicas para transportar a mecânica de investigação para jogos de CoC.

O segundo apêndice trata de fontes de inspiração e informação sobre o Mythos e os anos 30.

O terceiro apêndice constitui-se em fichas de personagem, fichas para o Keeper organizar a campanha ou aventura, e cópias de algumas tabelas (mas nem de longe todas as necessárias).

O último apêndice traz uma breve biografia dos envolvidos com a criação do jogo.

Índices

Por fim, temos um índice de raças alienígenas, deuses, feitiços e criaturas, separadamente, assim como um índice remissivo. RPGs são livros de referência, então os índices são bem vindos. Em mesa, os índices do ToC sempre me ajudaram bastante.

Conclusão

Para um jogo que custa U$ 39.95, ToC é uma ótima compra. É bem produzido, as regras de investigação são instigantes, bem descritas, e dão um passo além do que já se fez sobre a matéria em outros RPGs. O livro é muito útil para quem não jogava CoC, e quer um jogo sobre o Mythos. Para quem já joga CoC, e por algum motivo não gosta mais do sistema, ou está interessado em novas opções de como descrever o Mythos, o livro também é uma boa compra.

O livro funciona não só como jogo, mas uma caixa de idéias, que podem ser transplantadas com facilidade para outros jogos investigativos e/ou de terror, seja pelo aspecto do sistema, seja pelas interpretações do Mythos que contém. Com efeito, agora no final, relendo a resenha, percebi que, em especial sobre o capítulo do Mythos, não fiz justiça à qualidade do material, que definitivamente merece ser lido.

Por fim, ToC vale a pena ser comprado para quem se interessa por sistemas interessantes, tendo em vista suas mecânicas pouco ortodoxas, e a criatividade com que foram desenvolvidas.

Igor

2 comentários:

  1. Muito boa resenha Igor, tá de parabéns cara. Despertou bastante minha curiosidade sobre esse jogo. Caso façam uma vesão nacional serei estarei bem tentado a comprá-lo.

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  2. Parabéns, ficaram muito boas as resenhas..
    Só falta agora ele chegar aqui no Brasil em novembro

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