sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Mestre Reclamão: O D10 Escuro é A Dezena!



 Esse texto começa estranho, porque logo de cara já tem duas digressões. Bom, eu não sei se dá para falar propriamente em digressão no início de um texto, mas se eu entrar nesse mérito eu começo a terceira.

Em qualquer grupo de RPG, a partir de certa idade, você encontra gente de diversas profissões: advogados, psicólogos, médicos, engenheiros, atores, administradores... Obviamente, é impossível conhecer a fundo a profissão de todos os seus jogadores, mas uma coisa eu tenho certeza; em qualquer profissão, para as coisas mais corriqueiras, há um procedimento padrão. Coisas simples como: sempre cheque se os instrumentos cirúrgicos estão esterilizados, sempre verifique se o equipamento está alimentado antes de abri-lo, sempre verifique se as custas foram pagas, sempre verifique a nota fiscal antes de dar o recibo do produto...

Acho que posso afirmar sem erro, ou quase sem erro, que se você tem mais de doze anos de idade, consegue compreender que para certos tipos de coisas, antes de analisar qualquer problema, você segue um procedimento padrão, e que isto facilita em muito sua vida. Se você concorda comigo até aqui, vou para a segunda digressão. Se não concorda, pode parar de ler por aqui, porque com nada que eu escrever adiante você vai concordar.

Segunda digressão: se você já jogou WAR, Banco Imobiliário ou Jogo da Vida, você deve ter percebido que sempre que alguém rola os dados/gira a roleta, o faz em um lugar visível, onde todos os outros jogadores podem ver os resultados do dado. Ninguém lança os dados ou gira a roleta escondido. Afinal, a vitória depende do resultado dos dados ou da roleta. Nada mais justo que todos saibam os resultados  dos dados.

Pois bem, quando eu mestro RPG eu adoto também alguns procedimentos padrão. Um deles, é que sempre que você rola dois d10 para simular um d100, a dezena é o dado mais escuro. Por que eu faço isso? Eu vou explicar mais adiante.

Pois bem, tem um jogador meu que fica completamente irado com a ideia de eu achar que ele possa estar roubando. Ele se sente profundamente ofendido com a minha "insinuação implícita" de que ele possa "mudar a dezena" a cada rolamento. Recentemente nós fomos jogar D&D B/X, e ele ficou revoltado porque eu defini qual seria a dezena entre os dois d10, no rolamento de Pick Pockets do Thief dele.

Agora os meus motivos: Se isto já está definido desde o início, a gente deixa de perder alguns segundos a cada rolamento, enquanto o jogador decide qual vai ser a dezena. Por incrível que pareça, eu já vi gente demorar uns 30 segundos para decidir isso. Além disto, eu evito mal entendidos; já aconteceu em mesa minha de alguém escolher um dado para dezena e meio segundo depois se confundir. E, por fim, porque tem jogador que rouba.

Mas tem uma sutileza nesta questão. Na verdade, eu estou pouco me importando se um jogador específico está roubando ou não, ou se ele cometeu um engano. O meu problema é outro. Eu trabalho, tenho pouco tempo para jogar, tenho outros interesses na vida. Se eu tenho que parar para DISCUTIR se alguém roubou ou não, ou para DECIDIR se alguém se confundiu ou não, eu estou transformando meu "tempo de jogo" em  "tempo para resolver problemas". E pior, estou transformando o "tempo de jogo" dos outros jogadores em "tempo para assistir uma discussão idiota". E hoje em dia, eu tenho pouco tempo para jogar.

Ou seja, coleguinhas, se o Tio Igor quisesse aturar criancice, ele teria feito filhos.

Eu NÃO vou discutir.

Eu NÃO vou argumentar.

Eu NÃO vou nem parar para pensar no assunto. Está definido: o dado mais escuro é a dezena. Isto era bom para mim aos nove anos de idade, e continua bom agora. Eu elimino o problema antes mesmo que ele surja.

Da mesma forma quando o dado cai "torto" ou fora da mesa. Se o lado com o número está ligeiramente inclinado é um abraço: pode jogar de novo. Nem vou me dar ao trabalho de pensar no assunto. Afinal, a mesa é grande. Como você não consegue rolar um dado dentro da mesa, sem que ele esbarre em nada? Falta de coordenação motora? A tia do maternal não te colocou para fazer colagens o suficiente? Precisa fazer curso no SENAI?

Eu não quero saber se você está roubando, ou não, se você está distraído ou não. Eu estou aqui para me divertir também e não tenho paciência, nem tempo para isso. O procedimento padrão está previsto e vai ser seguido, para evitar até mesmo que a discussão sobre o problema surja. Eu não acho que o jogador é ladrão (apesar de ser thief). Repare, eu extirpei esse tipo de indagação dos meus jogos.

Afinal, se você joga os dados do WAR na frente de todo mundo, o que implicitamente é reconhecer que nenhum dos jogadores "confia" um no outro, porque que no RPG vai ser diferente? Inclusive, apesar da questão ser ampla demais para debater agora, por que as pessoas não tratam o RPG COMO QUALQUER OUTRO JOGO, em relação a este tipo de coisa? RPG tem exatamente a mesma importância da sueca ou do WAR! Por que o tratamento diferente?

Se o grupo quiser bolar um novo procedimento padrão que seja melhor, sou todo ouvidos, mas enquanto este existir, ele vai continuar sendo aplicado. E isso vale para vários tipos de procedimento. Se o item não estiver na ficha, ele não existe. Se você discute estratégia com outro player ou um NPC, isso é em "on" e os NPCs ouvem.

Agora porque eu estou tomando o tempo de todos vocês com isso? Porque este tipo de discussão acontece em várias mesas. É o tipo da discussão inútil, que só serve para perder tempo. Uma das coisas que eu mais vejo mestres reclamando, é justamente este tipo de discussão fora de hora, que não leva a nada, sobre qualquer assunto que pode ser discutido antes ou depois do jogo.

Muita gente vai falar: Ah, mas aí é só você botar o jogador no lugar dele. O que essas pessoas não percebem é que se eu parei para fazer isso, eu já perdi a discussão. Seja porque é trabalho à toa, seja porque na verdade o jogador problemático só quer atenção em detrimento dos outros.

Sério mesmo? Não dá para deixar para depois? É tão importante assim discutir como anotar as coisas na ficha, como rolar os dados, que não dá para esperar o jogo terminar? E se a indignação é tão grande com a "insinuação de roubo", porque ela não aparece quando se joga Banco Imobiliário? Mimimi de jogador! Nerdrage!

Faça um favor para seu mestre, para seu grupo e para você mesmo. Não comece discussões idiotas durante o jogo.

PS: Ah, e sabe o player que reclamou do lance do d10. No primeiro rolamento dele, ele pensou qual seria a dezena, mas esqueceu de dizer. E ele tinha pensado justamente o melhor resultado. E ainda reclamou quando eu o lembrei da regra do dado mais escuro.

Igor

8 comentários:

  1. Meu amigo, tu já pensaste em comprar um dado de porcentagem? Pronto, problema resolvido. Não teria margem pra discussões.

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  2. Eu não tenho discussões.

    Mas o ponto não é o dado em si.

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  3. Esse seu jogador é um vigarista, oportunista e sem escrúpulos.
    Estou sendo pesado demais? Acho que não.
    Um simples hobbie vai refletir em outros aspectos da vida? Acho que sim.
    Bah, ficou parecendo zorra total...
    Eu tenho uma amiga que é manipuladora desde a sua pré-adolescência. Sempre mentiu aos pais, namorados, amigos, professores, colegas. Sempre que confrontada pelos seus desvios, traições e traíragens sua defesa era simplesmente tentar inverter a situação e se mostrar indignada. Na maioria das vezes ela ainda conseguia ficar de vítima.
    Algumas pessoas são extremamente habilidosas em ganhar uma discussão mesmo estando erradas.
    É tipo aquele cara da faculdade que nunca trabalhou na vida, ganhou carrinho do papai, mas tá sempre com a camiseta do Che Guevara xingando o povo de burguês e reacionário.
    Pura vigarice e oportunismo.

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  4. Na verdade, eu o conheço a mais de dez anos, e o que você disse acima é tudo o que ele não é.

    Ele só se ofende com relação a essa parada do dado.

    O que nos leva ao ponto principal do texto, que não é o dado em si. Mas sim, porque começar esse tipo de discussão durante o jogo?

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  5. Leva a mal não Igor, mas vc desabafou severamente no post, o comentário do chuck é pertinente, pois eu também já estava quase mandado matar esse teu player. vc falou com muita mágua no coração, a noção que todos tem ao ler este post é que foi um "esporro" online.

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  6. Ah, mas não é não.

    Meus esporros são pessoais.

    E o tom dos textos faz parte da brincadeira. Afinal, é o Mestre Reclamão!

    De repente o texto ficou um pouco perdido pelo exemplo, mas o ponto principal não é o player, ou como se rolam os dados, mas sim que ás vezes alguém cria pinimba com alguma coisa na mesa, e atrasa o jogo totalmente à toa.

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  7. E, para deixar mais claro, é o tipo de coisa que só serve para atrapalhar jogo, e não é bom pra ninguém.

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  8. Igor, visualizei um tanto tardiamente este post, 4 anos depois dele ter ido ao ar. Mas achei super pertinente a abordagem do seu texto, brincadeiras ou exageros à parte.

    Vc é a 2a pessoa q eu conheço - a 1a sou eu msm - q aborda dicas pra Mestres do ponto de vista "Qual é o mínimo q o Mestre tem direito d exigir dos Jogadores?" A esmagadora maioria dos materiais d dicas pra Mestres em revistas, livros, blogs, etc, partem da premissa "O q o Mestre pode oferecer aos Jogadores?" E apesar d ambas premissas parecerem antagônicas, elas se completam.

    Afinal, o Mestre poderia estar transando, bebendo, vendo um filme no cinema ou apenas sossegado em casa. Mas não! Ele torra neurônios, noites bem dormidas e principalmente o seu tempo preparando aventuras, campanhas e td o mais pra um grupo q mtas vzs não está nem ai pro seu esforço. Pro isso, não acho q seja demais pedir por um pouco d consideração do grupo.

    Escrevi uma coluna similar ao Mestre Reclamão no blog RPGames Brasil, q se chama "Vamos Pôr Ordem Nesta Bodega!" Inclusive estou transformando ela num livro d msm nome, acrescido de muito mais material pertinente a este tema, q pretendo lançar no meio do ano q vem, através d financiamento coletivo. Quem quiser conferir o rascunho do projeto no Catarse é só acessar o link abaixo:

    https://www.catarse.me/livrobodega

    Gostaria d ver mais em voga esta abordagem em outras dicas pra Mestres. Um grande abraço Igor!

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