sábado, 24 de novembro de 2012

Resenha: Totems of The Dead

Então, uma esquimó, um viking, um monge shaolin e um guerreiro maia entram numa taverna...

Bizarro, né? Se uma campanha começa assim muita gente já começa torcendo o nariz. Eu confesso que de início eu torci o nariz, até parar para ler realmente a coisa toda.



Totems of The Dead, jogo de que já falei aqui, é uma ambientação ao estilo sword & sorcery. Para que não conhece o termo, é o subgênero da fantasia que engloba Conan, Elric, Fafhrd e Gray Mouser, Thongor... Os temas são mais "sujos", recheados de cinismo, e passam até por uma certa crítica social às vezes. Está para a fantasia tolkeniana, assim como os faroestes italianos estão para os filmes do Tom Mix. Quem quiser conhecer melhor o termo pode começar aqui.


O autor é Matthew E. Kaiser e o jogo foi lançado pela Gun Metal Games.

O interessante do cenário é que, ao contrário de focar em uma versão romanceada da Eurásia e África, o foco de Totems of The Dead é uma versão romanceada do continente americano, as Untamed Lands, a que é dado o "tratamento Conan", ou seja, as culturas e a geografia são alteradas, para adaptar-se a um cenário de fantasia, mas muitos elementos são mantidos, permitindo identificar de onde surgiram as idéias. Além disto, duas raças são claramente de origem fantástica.

Porém os povos originais das Untamed Lands não estão sozinhos. De outras partes do mundo vieram outros povos, com o objetivo de pilhar e/ou se estabelecer nas Untamed Lands, movidos pela ganância, ou fugindo de seus inimigos. Todos estas culturas estão abertas aos jogadores, assim como duas raças não humanas. São elas:



  • Feral Ones - seres parecidos com humanos, mas com características físicas e psicológicas de animais selvagens. Uma espécie de "elo perdido" que deu certo.
  • Humanos- A maior parte das culturas das Untamed Lands é de humanos, nativos ou não.


    1. Amizani - A sociedade matriarcal que habita a parte mais ao sul das Untamed Lands, próxima ao Amizani Serpent River. Somente as mulheres costumam viajar para o norte, normalmente para trabalhar como mercenárias.
    2. Artic Tribesman - Os povos nômades que vivem no norte gelado das Untamed Lands. Alguns deles aprenderam a forjar o metal meteórico, tão resistente quanto aço, que é incomum entre os povos nativos. Alguns domesticaram o mamute, que é usado como montaria.
    3. Atlantean Outcasts - Atlantes no exílio, afastados pelos sucessivos golpes militares que assolaram Atlântida. Viajam como bárbaros, sem ter, na maioria das vezes, povoados próprios.
    4. Bantanu - As tribos que vieram do continente de Borea (África) com o fim de se estabelecer, explorar, e até mesmo pilhar. Um povo orgulhoso que se considera guardião do Berço da Humanidade.
    5. Buffalo Plains Tribesman - Povos nômades ou semi-nômades, que vivem da caça ao búfalo, percorrendo as planícies. Com a introdução do cavalo nas Untamed Lands pelos Skadians, surge entre eles uma cultura onde o animal é fortemente integrado.
    6. Desert Tribesman - São os nativos dos impiedosos desertos do sudoeste. Se dividem entre os construtores de "pueblos" e os nômades do deserto.
    7. Eagle Coast Tribesman - São as tribos que vivem nas florestas do noroeste, onde devido à fartura de água e comida, grandes comunidades surgiram. São peritos no trabalho com madeiras, dos quais fazem arte, armas, armaduras e diversos tipos de objetos.
    8. Eastern Woodlands Tribesman - Descendentes dos misteriosos mound builders, são um povo guerreiro, cuja vida tribal é repleta de rituais. Possuem as maiores cidades ao norte dos grandes impérios.
    9. Grandfather Mountains Tribesman - Moradores dos vales das montanhas do oeste, protegidos das piores invasões de nativos ou estrangeiros, desenvolveram comércio avançado e moeda própria.
    10. Half-breed Outcast - Um fruto da união entre dois povos diferentes, e que não foi aceito pela cultura de nenhum de seus pais.
    11. Ruskar Independent - O corajoso povo que veio dos estreitos do oeste, com o fim de pilhar as Untamed Lands, por ordem de seu imperador, o Knias. Por algum motivo, o Independent deu às costas a seus irmãos, e vaga pelas Untamed Lands.  Como os Artic Tribesman, domesticaram o mamute, e também utilizam os dentes-de-sabre em caçadas.
    12. Shenese - Povo de feições orientais, estudioso da alquimia, que vive na cidade fortificada de Shen. Compostos de várias etnias, a diversidade cultural dentre eles é enorme. Possuem amplas habilidades comerciais, técnicas avançadas de astronomia, alquimia, e extremamente desenvolvidas de combate desarmado e meditação.
    13. Skadian - Vem d'além do mar do leste, em navios com a figura de dragões na proa. Há gerações nas Untamed Lands, as etnias Skadian dominaram grande parte da terra. Com eles vieram as Spirit Mists, fenômeno místico pouco compreendido, que permitiu a entrada de gigantes e outras criaturas sobrenaturais estrangeiras nas Untamed Lands.
    14. Southern Empire Citizen - São os membros dos Impérios meridionais. Atualmente há dois grandes impérios ao sul. Os Maztlani vivem em cidades-estados, e adoram deuses que exigem o sacrifício humano. São ferrenhos guerreiros, a ponto de sua força militar incluírem tropas de elite especializadas: Caiman Warriors (especialistas em combates marinhos), Coyote Warriors (especialistas em táticas e escaramuças), Eagle Knights (tropa de honra, que está sempre à frente da batalha e inclui os guarda-costas dos nobres e sacerdotes) e Jaguar Warriors (ordem rival dos Eagle knights, são especialistas em assassinatos, emboscadas e no uso do veneno). Já os Yarcouan vivem no altos das montanhas mais ao sul do continente, onde erigiram grandes cidades de pedra. São um império novo, que tem o Yarcoua como imperador. São especialistas na alquimia, metalurgia e trabalhos com pedras. Seus guerreiros montam nos gigantescos pterodaustros, e combatem o inimigo do céu.
    15. Spirit Plateau Tribesman - São tribos de caçadores-coletores, que vivem próximo às Grandfather Mountais. São amantes da beleza, e seus objetos pessoais possuem artesanato intrincado. 
  • Skinwalker - Em todas as culturas humanas, acontece de surgir alguém com o poder natural de se transformar em um animal. cada cultura tem sua própria visão dos skinwalkers, respeitando-os ou odiando-os segundo seus próprios preceitos.
Vale dizer, que cada cultura humana apresentada pelo livro, na verdade se divide em dezenas de tribos, com características próprias, que tem que ser agrupadas para que seja possível tornar a ambientação em algo "jogável". Porém, na descrição do cenário, o jogo dá dezenas de detalhes, divididos por região, envolvendo ordens de feiticeiros, associações de tribos, rivalidades tribais, etc...

Uma coisa que eu gostei bastante do jogo é que, mantendo-se fiel aos temas sword & sorcery, nenhuma das culturas ou raças é demonizada ou santificada. Todas as culturas são apresentadas como iguais, compostas de indivíduos, com seus próprios objetivos e características.

Uma crítica ao livro é que, ao descrever as culturas humanas, o autor não aponta qual o povo que inspirou aquela cultura, o que pode dificultar eventuais pesquisas de quem queira adicionar mais características a sua personagem, seja jogador ou mestre. Porém, isso não quer dizer que as culturas não sejam apresentadas em várias facetas. A quantidade de material de cenário que o autor conseguiu incluir só no Player's Guide chega a intimidar o mestre de jogo.

Com efeito, é raro ver tanto material em um livro tão pequeno. O Player's Guide do Totems of The Dead traz regras novas de magia (inclusive poderes novos e alteração de poderes antigos), especializadas por cultura, alterações na criação de personagem, alterações no sistema de combate, discussão sobre os deuses existentes no cenário, equipamentos novos e um Gazeteer bem grande! Do jeito que está, sem suplementos, o Totems of The Dead me garante, tranquilamente, anos de jogo, sem precisar incorporar mais detalhes.

Em termos de sistema, o Totems of The Dead utiliza o Savage Worlds, com pequenas alterações. Algumas regras de criação de personagem são ligeiramente modificadas, e realmente seria muito descer em detalhes sobre todas elas. Entre as mais interessantes são as regras de Bravery/Despair, que acompanham o quanto a personagem é corajosa, segundo suas ações, com bônus ou penalidades nos rolamentos pertinentes.

O sistema de magia altera o sistema de power points original, mas coloca a possibilidade de falhas causarem conseqüências perniciosas no uso da magia. Além disto, o uso de certas magias (dano direto, invocação de espíritos maléficos, etc...) pode colocar a personagem no Path of Corruption, que levará (dãããã...) à corrupção da personagem, podendo ou não redundar em sua transformação num NPC.
Outra inovação interessante é a ideia de powwow. na celebração pós aventura, rola-se numa tabela, para ver que benefícios esta festa trouxe para o PC. Rumores para a próxima aventura, aliados, romances, presentes... Além disto, mantendo a ideia de aventureiros pobretões da sword & sorcery, se os PCs gastarem no powwow mais de metade do que adquiriram na aventura, ganham experiência extra.

As tabelas de falhas da magia e benefícios do powwow poderiam ser expandidos, pois as opções não são muitas. Especialmente esta última merece uma expansão, pois é rolada com muito mais freqüência.

Como normal no Savage Worlds, os PCs são Wild Cards, e tem uma série de benefícios mecânicos em relação às pessoas normais, conseqüência de serem aqueles grandes heróis. Especificamente em Totems of The Dead, a presunção é de que os PCs são aventureiros já com alguma experiência. O Savage Worlds é um sistema semi-genérico, com forte veia pulp, e o resultado é bem no estilo Conan + Guerreiros Apache que o jogo propõe.

Sem entrar numa resenha de Savage Worlds, que necessitaria de um post próprio, o combate é ágil e complexo, e tem o objetivo de permitir que vários oponentes (vários mesmo! Dez de cada lado, por exemplo). De modo geral, os PCs são pessoas extremamente competentes, mas a chance de morrer é bem real, o que combina com a ideia do cenário. Há forte ênfase no uso de miniaturas, mas elas não são estritamente necessárias. Em um combate de nossa primeira aventura, tínhamos quatro Wild Cards e quase vinte extras, e conseguimos levá-lo a efeito de forma rápida e eficiente "de cabeça", sendo apenas um mestre e três jogadores. Se alguém quiser que eu desça a mais detalhes sobre minhas impressões sobre o sistema, é só perguntar nos comentários.

O sistema tem atributos e skills, rolando normalmente só o skill. A criação de personagem é por pontos. O sistema usa os dados de d4 a d20, sendo que esses são os níveis dos atributos e skills (spellcasting d6, fighting d8, por exemplo). Wild Cards rolam também um d6, em paralelo, e utilizam o resultado mais alto, sendo que todos os dados "abrem". Atributos altos permitem comprar os skills por menos pontos.

Quanto às criaturas, o cenário mistura mitologia nórdica, indígena, oriental e russa, além de incorporar criaturas pré-históricas, criptídeos, referências aos Mitos de Cthulhu e clássicos de sword &; sorcey (homens-serpente), ou seja, é uma mistura enorme, que de alguma forma faz sentido, e nada fica deslocado. Considerando as raízes do sword & sorcery, isso é até esperado.


O Player's Guide traz a ambientação e as regras. O Game Master's Guide traz dicas, um resumo da estória do cenário, o bestiário, fichas de NPC padrão, um gerador aleatório de aventura (bom), um gerador aleatório de Nameless Horror (pra sua criatura inominável favorita), uma aventura curta para cada região do continente (bem ao estilo sword & sorcery) e várias idéias de aventura (são melhores até do que as aventuras). Por fim, há uma lista de venenos e doenças.

Para jogar são necessários dois livros, o Player's Guide e o Game Masters Guide. Atualmente, pelo que pude descobrir, eles só existem em .pdf, mas é possível comprar uma edição impressa. Por U$ 28,00 no total, nem está tão caro, se você levar em conta a quantidade de material. No total são 302 páginas, incluídas as capas. Ambos os .pdfs tem índice e índice remissivo com marcadores. Além disto, é imprescindível comprar o básico do Savage Worlds. No final, digamos que sai um pouco caro, mas você de quebra leva um sistema genérico.

A arte é bem feita e evocativa, vocês podem ver alguns exemplos nesta resenha.

Em relação aos .pdfs, tive problemas para abri-los no meu tablet (Android Ice Cream Sandwich) usando Acrobat, Ezpdf e OfficeSuite. No desktop não experimentei problemas. Porém, levem em conta que meu tablet é daqueles bem baratinhos.

De modo geral, se você tem interesse pela temática, ou apenas que ver um cenário pouco ortodoxo, recomendo adquirir o jogo, ainda mais porque o Savage Worlds está para ser traduzido, e, mesmo que assim não fosse, o livro básico custa U$ 10,00.



Igor

Um comentário:

  1. Esse cenário parece muito bom mesmo. Com certeza vou dar uma olhada boa nele! Adoro Sword & Sorcery.

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