Normalmente se ouve falar muito
dos benefícios dos jogos de RPG. Natural que algumas pessoas fiquem mais
curiosas e se aprofundem no assunto e outras, como acadêmicos e ou estudiosos
do jogo, escrevam material específico para seus cursos e ou trabalhos acadêmicos. Formandos em literatura, história, pedagogia, matemática, letras, entre outros,
escrevem seus trabalhos de conclusão de curso sobre o jogo, mas infelizmente a maioria
fica nas prateleiras da biblioteca das universidades.
Sem querer usar o jargão
acadêmico, vamos falar então de forma descontraída sobre os benefícios dos jogos
de RPG?
Habito da leitura
Um sinônimo perfeito para o RPG
pode se dizer “leitura”, para definir melhor basta saber, temos dois tipos específicos de jogadores em uma mesa
de RPG, o mestre de jogo e o jogador, ambos são obrigados, pela própria
estrutura do jogo, a ler bastante.
O mestre de jogo, como descrito no
trabalho de Andréa Pavãol, (Aventura da Leitura e da Escrita Entre Mestres de
RPG), tem de ser um ávido leitor.
O menor livro de regras que eu conheço, o RPG
Aventuras Fantásticas, tem mais de 100 páginas de pura diversão, e ele é só o
primeiro, pois para que a história que se desenrola no jogo tenha sucesso é muito importante que o mestre
conheça um pouco sobre mitos, religiões, formas de governo, tenha noções de
moeda, comércio e tecnologia, tudo para situar corretamente seu cenário de
jogo, por vezes o mestre é levado aos livros de história para poder narrar com
fidelidade a aparência de homens e mulheres de uma determinada época, como eram
suas armas, sua comida, suas cidades, qual o nível tecnológico daquela época,
como era sua medicina e suas estruturas sociais, roupas, etc.
A leitura estimulada pelos jogos de RPG não
para nos próprios livros de RPG, é levada através do romances de fantasia de ficção
científica de horror de comédia, o hobby dos jogos de interpretação é uma semente que cresce e leva esse curioso iniciar á uma jornada pelo mundo da leitura, ela cresce e leva muitas
vezes ao aprendizado de outras líguas como Inglês e ou francês, em resumo,
sinônimo de PRG é leitura.
Matemática
Por mais simples e básico que
seja um jogo de RPG, ele exige um mínimo de conhecimento em matemática, mas não
só o básico do somar, dividir, multiplicar e subtrair, existem abstrações que
são calculadas na hora, bônus e penalidades circunstanciais estabelecidas pelos
próprios jogadores, sem o conhecimento de matemática o jogador fica para trás
na hora de usar as regras, e como todos nós gostamos de um bom desafio, melhor
ter habilidades e perícias muito bem calculadas para hora da ação.
Os conhecidos sistemas de RPG (ou conjuntos de regras matemáticas e discriminações de habilidades, perícias e combate) são matemáticos! O número de sistemas de RPG disponíveis no
Brasil e no exterior passa da casa dos milhares, centenas de grupos de regras
diferentes usando porcentagem, números inteiros, negativos e positivos para
definir o resultado de ações. Quer atingir o monstro com sua espada? Role os
dados, faça as contas e veja se você acertou. Quer lançar uma poderosa magia
sobre seus inimigos? Lance os dados, some ou subtraia redutores e calcule o alcance para ver se
você acertou, esse é o mundo do RPG, esse é o mundo da matemática!
Socialização e Inclusão
Hoje em dia é muito comum se ver
nos meios acadêmicos o uso da palavra “inclusão”, jovens com as mais diferentes
dificuldades de aprendizagem assistem aulas com colegas da mesma idade em
escolas normais, isso é o resultado de anos de reeducação e mudança na
percepção das dificuldades dessas crianças e nos nossos preconceitos. Nesse
quesito o RPG sempre esteve á frente de seu tempo. Já em meados de 1980 Dave
Arneson, co-criador do primeiro RPG do mundo, o Dungeons & Dragons, usava
os RPG como atividade em salas de aula pelos Estados Unidos, ensinando
professores e recreadores sobre como usar o jogo como ferramenta pedagógica e
possibilitar a inclusão de alunos afastados pelo bullying e ou por suas dificuldades de aprendizagem.
Em torno de uma mesa de RPG todos são iguais e o
resultado positivo vem do trabalho em grupo, pois as habilidades de cada um dos personagens ajudará a levar o grupo ao sucesso.
Num jogo cooperativo, onde cada
jogador deve dar voz a suas idéias e ajudar o grupo, as barreiras do cotidiano,
do preconceito, da exclusão são banidas, meninos e meninas que durante um dia normal de
aula mal se falam, passam a interagir e agir em conjunto pelo bem do grupo,
ouvindo idéias, sugerindo novas e ajudando na resolução de charadas e
mistérios. O papel do jogo de RPG como sociabilizador, como agregador é fundamental. Como em qualquer atividade de grupo visando um objetivo
comum o RPG trata-se do famoso “trabalho de equipe” reino bem conhecido nos jogos de
RPG.
Outra questão importantíssima do
jogo é seu apelo global, não importa a classe social, onde você vive, se em seu
país as pessoas tem acesso a internet e ou podem comprar livros em livrarias,
ou consultar bibliotecas você vai encontrar um livro de RPG, existem centenas
de projetos gratuito de RPG na internet e vários modelos baratos para públicos
em todos os níveis de poder aquisitivos, o RPG é um jogo para qualquer pessoa.
Interpretação
Na infância passamos horas
vestidos como nossos personagens preferidos, seja um lençol no pescoço que vira
capa do Batman, ou uma cueca na cabeça para virar o homem aranha, o cabo
de vassoura vira espada de luz e o travesseiro escudo, á medida que ficamos
velhos tentamos arranjar desculpas para continuar nos fantasiando e
interpretando nossos personagens preferidos, seja no carnaval, nos bailes á
fantasia ou no halloween. Interpretar está na natureza humana, interpretamos
quando queremos nos mostrar mais sérios e ou quando queremos comover alguém,
interpretamos para ganhar a paquera na escola ou no círculo de amigos.
Os RPGs oferecem uma oportunidade
saudável para interpretação, criar um personagem de RPG é muito mais que anotar
números em sua planilha de personagem, muitas perguntas são frequentes:
Como
meu personagem fala? Ele tem alguma mania engraçada? Como meu personagem se
comporta em uma situação de perigo? Ele sai correndo de medo ou grita um brado de guerra e vai para cima dos monstros?
Essas características
são decisões que o jogador tem de tomar sozinho, independente da idade eles
criam e interpretam seus heróis. Crianças que jogam RPG esbanjam criatividade
para tornar seus personagens únicos, seja um anão rabugento que vive reclamando
a uma piloto de nave espacial muito confiante de suas habilidades, a
interpretação não só afasta a inibição como permite ao jovem a criança ou até
mesmo o adulto, a criar novas relações consigo mesmo e com os outros jogadores,
percebendo em suas construções a variáveis personalidades e entendendo melhor
os traços que as diferenciam das outras.
Criatividade
Como citado no texto acima,
crianças que jogam RPG esbanjam criatividade, não poderia ser diferente uma vez
que o jogo estimula várias esferas de conhecimento e perpassa até mesmo campos
de conhecimentos específicos, aqueles aprendidos em sala de aula o famoso
ensino formal.
A matemática, a leitura, a
interpretação, tudo isso leva a criança a construir um universo que também vai
para o papel, são desenhos, mapas, ilustrações de seus heróis, dos monstros
que eles enfrentam, de efeitos mágicos, ou seja, a criança começa também a
registrar suas aventuras ficcionais, ela cria um diário para seu herói ou registra
seus feitos mais memoráveis. Nos videogames esses registros são automáticos,
são digitais e só podem ser acessados através do computador, mas nas mesas de
RPG, mestres e jogadores anotam seus resultados e registram suas aventuras a
moda antiga estimulando a criatividade com cores, textos e papel. Na
interpretação dos personagens, no estímulo a escrita, ao contar suas histórias
a criança torna-se criativa e diversifica suas habilidades narrativas e
interpretativas.
Estratégia
Em novembro de 1922 foi descoberto o túmulo de Tutancâmon, resultado dos esforços de Howard Carter e do seu mecenas, o aristocrata Lord Carnarvon, eles encontrava um dos maiores tesouros da humanidade, o túmulo do
faraó Tutancâmon, e dentre os tesouros encontrados em seu túmulo com mais de
2.000 mil anos, vemos um jogo de tabuleiro, seu nome era Seneth.
Em Castela e Leão (Espanha), um Rei do século XVI chamado Afonso X, escreve o seu "O Livro
dos Jogos", um compendium de jogos de todo o mundo que apresenta as regras e os
tipos de jogos daqueles período.
Desde de antiga Ur, com mais de 4.000 anos de
idade encontramos jogos, é o caso do "Jogo de Ur", uma relíquia reconstruída a
pouco tempo por arqueólogos e historiadores e agora, nesse momento, cientistas,
arqueólogos e historiadores tentam entender e recriar um jogo de tabuleiro
Viking de mais de 1000 anos de idade chamado Scanian (Link http://www.medievalists.net/2014/02/22/quest-lost-gamers-investigation-board-gaming-scania-iron-middle-ages/).
A importância dos jogos como
expressão das culturas que o produzem é reconhecido por reis, sábios e lideres
por toda história do homem, na Alemanha,
Inglaterra, Japão e EUA os jogos de guerra são usados no treinamento de
oficiais até os dias de hoje, a estratégia militar representada em tabuleiros e
regras de jogos de guerra permitem a homens sérios e determinados traçarem os
rumos de grandes batalhas. Esse modelo de aprendizagem usado de forma lúdica
nos jogos de RPG é que permite aos jogadores determinas qual melhor estratégia para
vencer desafios, enfrentar exércitos imaginários ou simplesmente salvar a
donzela, os jogos de RPG são excelentes mecanismos de simulação estratégica e
podem variar muito do tipo de situação apresentada, desde de como sair vivo de
uma briga de taberna cheia de Orcs até liderar um exército com milhares de unidades
militares em campo de batalha, a estratégia é parte importante da rotina do jogo
e não se limita só ao apelo bélico, temos intrigas de corte, disputas
políticas, todos esses eventos pedindo a criação de estratégias para que os jogadores possam ter sucesso em sua aventura.
Capacidade Cognitiva
Tentei falar na linguagem menos
acadêmica ou cientifica possível, mas agora vamos falar de um tema bem
explorado e prá lá de bacana quando se fala em atividades lúdicas e seus
benefícios, o desenvolvimento ou das capacidades cognitivas.
Mas o que é Cognição? Vamos a uma definição
simples e direta: “Cognição é o ato ou processo da aquisição do conhecimento que se dá através percepção, da atenção, memória, raciocínio, juízo, imaginação, pensamento e linguagem.
É o conjunto dos processos mentais usados no pensamento na classificação,
reconhecimento e compreensão para o julgamento através do raciocínio para o aprendizado de determinados sistemas e soluções de problemas.
De uma maneira mais simples,
podemos dizer que cognição é a forma como o cérebro percebe, aprende, recorda e pensa
sobre toda informação captada através dos cinco
sentidos.”
Em outras palavras, tudo que já
explicamos a respeito das esferas de conhecimento e da socialização passam pela
cognição, os jogos de RPG conseguem oferecer uma imersão no universo cognitivo
e também permite o seu desenvolvimento.
Mas nem tudo que reluz é ouro!
Já levantamos aqui um altar aos
benefícios dos jogos de RPG, mas esse não seria um post imparcial sem falarmos
dos problemas entorno do jogo.
É importante entender que “tudo
que é D+, faz mal” o RPG também pode se tornar um “vício ruim” se não dosado.
Viver algumas horas num mundo de
fantasia contando uma história em grupo com amigos no fim de semana é uma
coisa, todo dia enfiado em livros de RPG é preocupante.
O RPG não pode ser um substituto
para vida real, e também não pode ser a única literatura que passa pelas mãos
de jovens, adolescentes e adultos, o mundo possuem uma tradição literária muito
rica para ficarmos enfiados em livros de RPG em todas as fases da vida.
Existem RPGs com temas muito
variados, e muitos são para um público adulto, a maioria dos livros tem a
indicação etária na capa e isso ajuda pais e professores a estudar qual a
melhor opção para a fase do jovem jogador.
Recentemente um documentário
chamado "Game Masters" mostrou a influência negativa do jogo sobre a vida de três
mestres de RPG estadunidenses de diferentes estados americanos e de classes sociais diferentes, os três usaram o jogo como forma de “escapismo da realidade” e isso trouxe problemas
para os três social, psicológica e financeiramente.
Com a orientação adequada e
supervisão de pais e educadores o RPG acaba apresentando muito mais vantagens
que desvantagens, o jogo estimula a criatividade, mobiliza as esferas de
conhecimento de crianças, jovens e adultos, incentiva o hábito da leitura e
aguça a inteligência e agilidade da mente. Como educador, jogador de RPG com
mais de 20 anos de experiência e tio coruja, aconselho á todos conhecerem os
jogos de RPG, o máximo que pode acontecer é você se apaixonar pelo jogo!
Espero que gostem e fiquem todos
com Deus!
Abs, Luciano Mota Bastos
Se quiser se aprofundar, pesquisas científicas sobre o RPG
ResponderExcluirhttp://www.pesquisarpg.ufpa.br/
Gilson
Valeu a dica Gilson!
Excluir