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Esperamos que gostem!
Notas Sobre o Mega-apocalipse
por
Henrick Sheeley
Penso que deveria iniciar indicando o local e a data
nos quais me encontro e talvez me apresentando, mas tenho motivos para não
fazê-lo. Primeiro: desconheço a data precisa. Segundo: encontro-me peregrinando
de conglomerado em conglomerado nos sertões congelados do hemisfério norte. E
terceiro: minha identidade precisa ser mantida em segredo, pois sou um
desertor, traidor de minha fé.
Às vezes penso na ignorância dos meus contemporâneos.
Não falo do analfabetismo – generalizado –, da intolerância e de
fundamentalismos de toda sorte. Falo da falta de conhecimentos, conhecimentos
enterrados nos escombros das civilizações pré-apocalípticas. Em que pese o
estado de ignorância, a muitos motiva e consola uma nostalgia e uma curiosidade
acentuadas sobre o passado. Alguns ainda discutem se a data que aparece no
noticiário do LondonNews, 2088 d.C., está correta. Outros vão mais fundo e
desejam saber como era a vida antes do Mega-apocalipse. Finalmente há aqueles
que desejam saber o que provocou o Mega-apocalipse.
O que se sabe com certeza é que nas primeiras décadas
do século XXI “algo” ocorreu ao planeta, transformando-o num indeciso inferno
de fogo e gelo. Enquanto o hemisfério sul virou uma massa ardente de selvas
tropicais e terreno árido esbatido pelo sol, o hemisfério norte congelou,
transformando-se num verdadeiro Ártico sem fronteiras. Talvez a causa tenha
sido o aquecimento global, a inversão dos pólos magnéticos, a inclinação do
eixo do planeta, uma superarma desconhecida, o há muito temido apocalipse
nuclear – eu jamais as encontrei, mas há os que afirmem ter avistado imensas
cicatrizes atômicas nos sertões.
O fato é que a nova Idade de Fogo e Gelo
sobreveio, deixando vivos apenas os mais fortes dentre os fortes, aqueles
conhecidos hoje como supersobreviventes. Porém mesmo esses seres humanos
extraordinários não puderam, em sua maioria, resistir ao que se seguiu poucos
anos depois: a Peste promovida pelo megavírus, uma implacável virose que, ao se
tornar uma pandemia em escala mundial, exterminou seus hospedeiros em fulminantes
ataques de raiva primeiro assassina, depois suicida. Até onde se sabe, não
houve quem escapasse ao contágio. Houve, contudo, quem se descobrisse imune.
Estes sofreram, no período que se seguiu a este derradeiro armagedom, dolorosas
mutações genéticas. Assim surgiram os psiônicos e os primeiros mutantes férteis
que então deram origem a espécies próprias, como os morlochs, habitantes dos
subterrâneos; os enormes juggernauts; as aberrações de múltiplos braços
conhecidas como mantis; os poderosos psiônicos chamados mentalos; os videntes
ciclopes e, finalmente, os descendentes diretos dos supersobreviventes, os
megasobreviventes – exoapocalípticos brutais, capazes de sobreviver aos perigos
do mundo pós-apocalíptico.
Dentre esses perigos, destacou-se a vinda maciça –
por meio de portais psíquicos inadvertidamente abertos por planarcinéticos de
primeira viagem – de seres dos reinos psíquicos, ou psicoreinos, os chamados
planares; também a ocorrência das primeiras incursões de tribos bárbaras
germânicas e asiáticas sobre os conglomerados europeus, demais cidades-estados
e pequenos países ditos civilizados; e o aparecimento, primeiro no Novo Reino
Unido, depois no Velho Mundo e atualmente no Novo Mundo, a partir da nova
cultura medievo-marcial surgida em toda parte devido ao culto exoapocalíptico
do mais forte – enquanto apenas os bravos se lançam ao combate singular, um
covarde qualquer pode disparar uma arma de fogo –, das Novas Ordens de
Cavalaria, como os Steppenwolves (Reich), a Ordem da Torre e Espada e os Sebastianos
(Lusitânia), a Ordem do Cardo-selvagem (Nova Escócia), os Cavaleiros da
Concórdia (Castela), os Hell Angels (REINI – República dos Estados
Independentes de Nova Iorque) e os Easy Riders (Estados Anárquicos e CCP –
Conglomerado da Costa do Pacífico).
O pouco que se pode dizer com certeza a respeito do
Fim do Mundo, ao cabo, foi que se tratou do fim de um mundo, mas também do
nascimento de outro. O Mega-apocalipse fora apenas um duro golpe para testar a
capacidade da espécie humana em superar adversidades. O homo sapiens sapiens
havia desaparecido, mas dera lugar a novas espécies, umas alienígenas, outras
irmãs, estas coletivamente conhecidas como homo apocalipticus.
Em termos políticos, dos escombros ergueu-se uma nova
religião, autoproclamada quarta fé abraâmica, fundada na fusão de tradições
mais antigas como o Cristianismo e o judaísmo. Os membros dessa religião,
conhecida somente como Irmandade, chamaram a si mesmos de teurgos e lideraram
os exoapocalípticos na reconstrução de suas vidas sobre as ruínas das antigas
cidades do Velho Mundo, os chamados conglomerados. Outros governos, uns mais,
outros menos organizados, apareceram em esparsas regiões do globo. O resto:
deserto.
Nos Anos Médios da Reforma – as três décadas
posteriores ao retorno da vida nas grandes cidades no hemisfério norte, em
especial Velho Mundo e norte do Novo Mundo – foram construídas as Catedrais –
colossos góticos, símbolos do poder sobrenatural e moral corrupta da Irmandade.
Também foram nesses anos que a religião começou realmente a impor sua ditadura
sobre as populações dos conglomerados. Reforçando a já instalada Cultura do
Combate Singular, promulgou-se a lei baseada num insondável dogma da religião,
o qual proíbe o comércio, posse e uso de armas de fogo, o que só fez impulsionar
a nova cultura de rinhas, duelos e sua contraparte política, os monstruosos
espetáculos em arenas particulares e aqueles promovidos pela própria Irmandade
como parte de sua política de pão e circo.
O pico da ditadura foi o surgimento da Inquisição, que
passou a percorrer os conglomerados à caça de infiéis, hereges e psiônicos
livres – o psionicismo além das fileiras da fé e do seu braço armado, os
Cavaleiros Templários, tido como ilegal. O avanço da Inquisição sobre o resto
do mundo serve, hoje, como justificativa ou como razão, dependendo do ponto de
vista, para a expansão imperialista da Irmandade. Ouvem-se em toda parte
rumores sobre Cruzadas continente adentro e invasões bem-sucedidas nas praias
do Novo Mundo – os templários e seus exércitos de mortos-vivos reanimados por
cronocinese espalhando-se pelo mundo como um ferimento em estado de necrose.
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