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quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Filme " Reza a Lenda", o Primeiro "Cangaço Punk" Brasileiro.



Pagina do filme no Facebook: Reza a Lenda- Filme

E vamos que vamos!





"Ara (Cauã Reymond) é um homem de poucas palavras, mas muita determinação. Ele vive em uma terra devastada e sem lei que espera ansiosamente por uma espécie de messias que devolva a justiça e a liberdade, que foram usurpadas pelo cruel Tenório (Humberto Martins), ao povo da região. Auxiliado por sua gangue de motoqueiros armados, o rapaz irá lutar contra o universo ao seu redor e seus próprios dramas - como os ciúmes de sua mulher, Severina (Sophie Charlotte)." (sinopse colada do "Adoro Cinema" - excelente site, por sinal)

Sophie Charlote, Cauã Reinolds e outros atores nacionais em uma produção no melhor estilo Mad Max.

Mad Max??? Naaah!

"Cangaço Punk"!!!!!


Bom ver ideias bacanas indo para as telonas.

Isso e as noticias do excelente livro de Leo Lopes "Rio -Zona de Guerra"  mostram a força que este tipo de temática está ganhando ente o público nacional.

Muito bom.

Brega Presley.

Virgo, Volante de Aluguel: Parte 3 (final)

Parte 1 do conto: AQUI:
Parte 2: É por Aqui
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A porta lateral começou a abrir raspando o metal contra o apoio.
Do outro lado, um segurança dos Cacheiros segurava um par de algemas, aparentemente destinados à Flávia, a ex-ocupante do porta-malas, e era melhor nem pensar para onde ela seria levada depois  o que seria feito dela.

O segurança olhou por um instante para a garota em pé, um tanto surpreso. Mais surpreso ainda ele ficou com a azeitona que abriu uma cratera do tamanho de um polegar em sua testa, logo depois. Ele morreu antes mesmo do som do disparo chegar a ser processado pelo seu "agora em um estado lastimável" cérebro.

Depois de arejar as ideias do bandido, Virgo tinha um problema pela frente: Sair dali nos próximos 30 segundos,antes da equipe de segurança dos Cacheiros (armados até os dentes) ou dos Cachaceiros (funcionários da Usina de Álcool geneticamente alterado) terem tempo de se mover e tomar a dianteira.

Virgo pegou as chaves de um furgão que parecia em bom estado, enquanto Flávia enviava um pano no tanque aberto de um dos carros, deixando um pouco do tecido para fora. Quando Virgo acionou o carro e abriu a porta do passageiro, Flavia simplesmente acendeu o pano com um "zipo" e saltou para o banco do carona, enquanto o carro acelerava.

A cabeçada que deu em Virgo foi um pouco descuido, e um pouco provocada. E a piloto pareceu se importar muito pouco com isso. Arrebentando o portão da garagem e uma das grades protetoras, dispararam para o deserto ainda sombrio, na esperança das sombras as protegerem.

Adicionar legenda
Um  ruido de explosão confirmou que haveriam menos veículos disponíveis para a perseguição, mas certamente algum ainda daria problemas.

Flávia pulou para a traseira, a primeira vez em um bom tempo que ficava ali por vontade própria e começou a procurar o que poderia usar. O que elas tinham de combustível,pelo que a moça tinha dito, seria o suficiente para chegarem a algum lugar longe dali, mas não poderia ser usado como arma.

A pistola de Virgo seria de alguma utilidade, mas não contra um veiculo blindado dos Cacheiros. Eles sabiam se cuidar, era um fato. Elas então tinham dois problemas: Chegar na Máquina. E fazer isso sem testemunhas. O que levava a uma inconveniente dificuldade, que basicamente poderia ser definida em "Como caralios fazer isso".

Virgo listou, mentalmente, os pontos negativos. Um bando de filhos de uma mãe armados até os dentes, um satélite maluco pronto para sobrevoar a região em meia hora (e isso se aqueles malditos hackers não fossem só mais um bando de patetas paranóicos). E claro, o maldito sertão. O mar sem fim de areia e calor que engolia vidas como se fosse um pântano.

Pontos positivos: A garota ao lado não era estúpida. E estava gritando sobre ter encontrado algo. A voz dela parecia dar estranhos saltos no peito de Virgo. Caramba, Virgo, jura? Paixonite instantânea em uma hora dessas? Fora isso, ela era uma volante excepcionalmente competente, e improvisava bem. Bom, os dados estavam lançados. Hora do show.

Um furgão branco se aproximou a grande velocidade vindo por trás. Era um tipo de veículo de caça, o que significava pouca blindagem mas considerável poder ofensivo. Virgo jogou o seu carro para o lado no momento que uma saraivada de balas vazou a areia fofa pela direita. Virgo jogou o veiculo rapidamente para a esquerda enquanto uma nova rajada passou zunindo pela esquerda.

Se o armeiro do carro de caça estivesse com um mínimo de noção do que fazia, a proxima saraivada seria em curva. Menos dano, mas uma área maior atingida. E este seria  o fim. Virgo freiou com tudo e sentiu a pancada na traseira com força.

A vantagem de uma colisão assim é que os danos frontais de um veiculo vão em boa parte para o bloco do motor, enquanto que a traseira, mesmo detonada (e com um eixo torto) não chega a perder potência de fato.

A desvantagem é ter de aprender uma porção de palavões novos da carona. Mon Dieu, que boca suja. Isso ia ser interessante!

Conforme ganhou distância do perseguidor, o suficiente para o armeiro, agora recuperado, não conseguir mais acertar um tiro, e em poucos minutos Virgo entrou com o furgão no leito seco do rio. As pedras ali impediriam que o rastro fosse seguido, e poderiam andar a pé para longe do veículo abandonado.

Flávia mostrou o que tinha encontrado: Uma capa térmica, que permitiria que ficassem escondidas um dia ou dois com os mantimentos de emergencia do furgão, cobertas e sem serem espiadas por algum satelite bisbilhoteiro. Nem mesmo os voyers dos Cacheiros perderiam tempo demais com um roubo pé de chinelo de combustível.

A Tempestade estava chegando, afinal, e eles teriam outros problemas quando o período conturbado se iniciasse.

Virgo carregou o combustível, mantimentos e a manta até uma encosta fofa e se jogou de costas, puxando a coberta para cima de si mesma. ela não era lá muito grande , mas Flávia não precisava ficar assim tão perto, quando entrou junto.

Definitivamente, a espera seria interessante.
Brega Presley

segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Virgo, Volante de Aluguel: Parte 2

Leia a primeira parte aqui: Virgo: Volante de Aluguel 1
Quando começou a anoitecer e o calor arrefeceu levemente, respirar não era mais um ato de bravura e Virgo se colocou a caminho. Eram cerca de 3 quilômetros para sudoeste indo do Posto de Areia. Com faróis desligados e chegando com o final de claridade do dia, ela deveria conseguir avistar o prédio e, com alguma sorte, não ser vista.

Mexer com marimbondos tinha seus problemas. Se eles percebessem o furto de alguns galões antes de ela dar o fora do alcance deles, estaria em péssimos lençóis. Era preciso chegar perto, encher alguns galões que conseguisse e sair dali antes de chamar a atenção de uma patrulinha enxerida.

Por mais forte que seus braços fossem (Você não parece uma mocinha" mamãe dizia), fazer tudo isso seria cansativo, e algumas viagens seriam necessárias. Cada galão com 5 litros, 10 litros por viagem, 40 litros para o tanque (mais um para a reserva, mas esse não valia o risco), quatro viagens.

O tempo de cada ida era uma incógnita. Virgo não sabia se encontraria uma torneira ou tanque facilmente na refinaria, se teria de vampirizar o tanque de algum carro dando bobeira ou se acharia alguma bomba. Não sabia nem se encontraria algum local seguro para pegar combustível e todo o esforço poderia ser em vão. Se fosse o caso, restaria a ela voltar comk o pouco de combustível que tinha e passar alguns dias dormindo no carro até ter outra solução, mas certamente perdendo o dinheiro da entrega ou recebendo muito menos pelo atraso.

Com a Máquina quase em ponto morto e na banguela ("Na bengala" como a irma dizia quando era criança) desceu até o leito seco de um rio. Aquilo era um canion, atualmente, e poderia fica ali por horas se deixa-se o carro no lugar certo. Hora de pegar a mangueira, dois galões e partir para fazer justiça agrária.

A noite estava quente, como naquela época costumava ser. Sempre tinha ouvido que desertos eram frios de noite, mas pelo visto o cangaço seguia sua própria lógica pós-apocalíptica de vez em quando. Os mosquitos não estavam incomodando e fora alguma cucaracha mutante, não deveria ter maiores problemas.

Depois de alguns minutos de caminhada viu as luzes atrás de um morro. Era um galpão de bom tamanho, possivelmente uma estufa com pés de cana-de-açúcar transgênico que os Refineiros tanto amavam. Bando de caipiras do inferno.

Tinha saído com um certa vez, Ele bebia preciosos copos de cachaça que valiam mais do que ele tinha na cabeça. Acabou bebendo além da conta aquele dia, sinal de que ela também nem sempre tinha uma cabeça assim, tão privilegiada, e fez um sexo meio sem-graça com o sujeito. no fim, ficou com uma ressaca monstruosa, suspeita (felizmente não-confirmada) de herpes do agreste, e nenhuma aspirina de reserva. Além de descobrir que pinga lhe propiciava uma deliciosa enxaqueca, ela guardou na memória a dica de nunca mais sair com um imbecil daqueles. Pena, alguns eram até bonitinhos.

Enfim, enquanto pensava sobre seus descaminhos amorosos, Virgo, a "nem tão virgem assim", chegou perto o suficiente do prédio para ter de se abaixar. O galpão da refinaria era bem guardado, com uma cerca e patrulhas que passavam de vez em quando. A boa noticia é que eles não esperavam que alguém fosse imbecil o suficiente para se aproximar de um prédio guardado pelos paramilitares Cacheiros. A má notícia é que ela era um bocado imbecil e ia tentar algo assim de qualquer forma.

A piada corrente era chamar os guardas de refinaria de "cachaceiros". Mas, ela desconfiava, quem precisava estar sob efeito do álcool para fazer algo assim eram os invasores. Chega. Melhor parar de pensar negativamente. Ou então era mais correto ir embora agora e deixar as coisas acontecerem.

Com as mãos cavou um ponto que considerou seguro por debaixo da cerca. Haviam alguns holofotes, aqui e ali, mas os guardas estavam com o mesmo calor que ela, e passavam as luzes para lá e para cá com certa preguiça. Ela conseguiria ir sem maiores dificuldades se não chamasse atenção.

Ao se aproximar de um prédio secundário do que parecia uma garagem, Virgo encontrou o que queria: algumas caminhonetes paradas, de onde conseguiria pegar combustível com sua mangueira. Algum guarda certamente apareceria ali em algum momento, mas se trabalha-se direito, mesmo com um guarda a poucos metros, ela acabaria o serviço e sairia ilesa.

Encontrou o tanque de um furgão, abriu a tampa com uma chave de fenda, chupou o combustível e deixou as leis da física trabalharem, enchendo cada um dos galões. Um pouco de cheiro de álcool poderiam ser indicio de algo, mas duvidava que, tão perto da refinaria, isso seria um problema.

Quando acabou, fechou as tampas do carro e do galão e ergueu os galões. Quer seja por causa do peso, por ter inalado quimica demais ou simplesmente pelo cansaço, o fato é que Virgo perdeu o equilíbrio e bateu, levemente, na lateral do carro.

Uma voz feminina imediatamente pareceu despertar da traseira.

-Quem está aí?  - disse em voz meio rouca, como se não falasse há muito tempo. - Quem está aí? repetiu. E a desgraçada começou a chutar o lado de dentro e a fazer barulho. Urros e brulho não era o que Virgo desejava naquele momento.

-Shh, fica quieta, seja quem for, ou estamos ferradas, aqui.
-A voz se calou por um instante, como se pensasse a respeito. Então perguntou, em voz mais baixa - Está presa também?.
-Não. Eu vim por outra razão, mas fica quieta, porra! - foi difícil sussurrar um palavrão naquelas condições.
-Me tira daqui. Estou desesperada. Por favor.
POP, pensou Virgo. Problema de outra pessoa, não valia a pena se meter.
-Faz assim, vou voltar em 20 minutos e te tiro daí- disse, se sentindo mal pela mentira.
-Quer saber, acho que não tira não. Me livra dessa ou vou fazer tanto barulho que vão pegar você e quem estiver contigo em flagra.
-Caralho, você é louca. Vou embora- Disse Virgo e começou a se afastar.
Antes de dar 2 passos a maluca começou a gritar dentro do carro e chutar a lataria. Péssima forma de se passar incógnita.
-Silencio, merda-caralho, ok, te tiro dai agora, mas para senão a gente está ferrada. Quieta. - E começou imediatamente a trabalhar na fechadura.

Aparentemente, a prisioneira conseguia ouvir a pilota trabalhando porque ficou quieta todos os longos minutos que aquilo demorou. Quando "clique" esperado finalmente anunciou o fim do arrombamento delicado, a porta traseira finalmente se abriu, Virgo foi surpreendida.

Em primeiro, veio a imagem de uma moça jovem, mais ou menos da idade dela,  com uma aparência que era de dar pena. Ou seria, se não estivesse tão puta da vida ainda com a chantagista. Ela tinha a pele morena e cabelos claros, provavelmente não naturais, dada as raízes escurecidas, mas parecia bem machucada e suja.

A seguir veio o cheiro, Algo indescritivelmente ruim, com o cheiro de urina e suor de vários dias. A garota estava com as mãos amarradas para a frente e cambaleou para a frente. Se esperava um abraço da salvadora, ficou no vácuo e despencou pesadamente no chão.

Virgo a ergueu. com os braços bem estendidos o mais longe possível da criatura. - Você está bem? Qual seu nome?- perguntou.
-Flávia Maria, me ajuda a sair daqui. Esses putos me prenderam há nem sei mais quantos dias.
-Fuuuu..., olha eu tiro você daqui, mas não posso levar um peso morto. Consegue andar?
-Acho que sim, preciso de uns minutos. - disse, movendo as pernas como se com câimbra ou formigamento.
-O trato é o seguinte: vou encher aqueles dois galões ali no canto com combustível. Com esses que ja enchi, isso é o suficiente pra sair daqui com lucro, o que significa viva. Você paga sua passagem pra fora do inferno levando eles até o carro. Deixe pelo caminho e fica na areia. Carrega e tem carona para fora. Feito?
-...feito, eu acho. 10, 20 litros não é tanto. Não sou nenhuma inútil. Me desamarra enquanto espera e a gente se manda.

Com Maria desamarrada, e os dois galões sendo enchidos de outro tanque - melhor o furto passar desapercebido - Virgo procurou um banheiro na garagem. no escuro achou um desodorante spray (aonde os Refineiros achavam essas coisas, hoje em dia) e gastou metade em cima da fedidinha.

A garota tossiu disse - Yach. Tá bom, entendi o recado. par de espirrar essa porcaria em mim. Não estou assim porque eu quero, bosta.

Virgo deu um sorriso vingativo e pensou - Essa é pela chantagem barata, vaca!- mas acabou por aí. Entendia o que a outra tinha passado e não pretendia prolongar a briga. Não era hora e nem necessário.

Trocou o galão e olhou para o pátio e o prédio central. Até aqui, apesar de tudo, estava tudo bem. Checou os galões que tinha enchido antes, fechou os novos, que seriam de Maria, e o tanque do carro. A sua carona deveria estar com fome, mas isso não era hora para piquenique.

Do lado de fora um carro saiu do prédio e passou pelo portão, lembrando Virgo que ainda tinham com o que se preocupar, já que ainda era começo da noite e os Refineiros do prédio estavam de serviço. Pelo menos alguns deles deveria estar. Olhando para Maria, fizeram sinal de que era hora de se mandarem. Em silêncio. A outra parecia entender isso. Menos mal. Ela não era uma mutante descerebrada.

E foi nessa hora que ouviram um assobio, vindo de uma porta lateral da garagem. Aparentemente, a sorte de Virgo durava menos que o tanque da Máquina.

(continua)

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

VIRGO, Volante de Aluguel - pt1 (Um Conto Cangaço Punk)

O que é "Cangaço Punk"?: Definição
O termo já existe em outros conceitos (moda e musica, por exemplo), mas aplicado ao que explico aqui, só no RPG do amigo Hudson Cesar, criador do sensacional "Além da Cupula do Opalão".

Em termos gerais é uma mistura de "Mad Max" com o cangaço brasileiro, formando (propositalmente) um impreciso ambiente geográfico e histórico que traz para o solo brasileiro um ambiente pós-apocaliptico que, acreditem, nada deixa a dever aos similares gringos.

De acordo com a linha histórica por ele desenvolvida, o ambiente de seca do nordeste das histórias cl´ssicas é repovoado em uma região dominada por jagunços armados por armas modernas, carros se enfrentando em um ambiente de desolação, e onde a agua e o combustível são bens que valem mais que o sangue de quem dos detém.

O "opala" do título é um misterioso veiculo que, de acordo com boatos, persegue e atropela pessoas nas estradas do sertão, gerando medo e/ou esperança dependendo de quem os boatos afirmam ter o veiculo assassinado.

Os jegues, os carros envenenados mas semi-destroçados, os personagens loucos, os messias e a miséria estão por todos os lugares, e sobreviver a cada dia é uma provação para os loucos e os hábeis.

O cenário, a partir do esqueleto original do autor, está gerando uma série de contribuições entre o pessoal da "Encontos Marginais", a mais anárquica das comunidades de RPG; Boardgame  no Facebook.

Um frankstein parte puro cenário de um autor, parte fruto da imaginação febril de colaboradores, é um cenário que ainda vai fazer barulho.

Importante: o jogo é um cenário de ação, não de humor, ainda que o humor negro e a temática adulta façam parte do mesmo. Ele está sendo incentivado (e ameaçado e chantageado) a formatar o material e publicar. Na minha kodesta opinião será uma excelente contribuição para o mercado brasileiro. Alô-alô editores, prestem atenção no cara. Tio Brega recomenda.
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Abaixo segue a primeira parte de um conto "Cangaço Punk" que estou fazendo para enriquecer o cenário do Hudson. (Publicado com autorização dele - somos marginais e punkers, mas dar o respeito a quem tem uma boa idéia é fundamental).

Segue:
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VIRGO, Volante de Aluguel - pt1
A marcha da máquina começou a emperrar, de novo, quando ia para o ponto morto. Virgo queria muitas coisas, mas um lugar que ainda tivesse óleo lubrificante era um dos que andavam no topo de sua lista. A areia fina estava causando um bom estrago e, em breve, não haveria um mecânico em todo o Recôncavo que conseguiria dar um jeito no fusquinha. 

Mas até a marcha seria um problema secundário se ela, nos próximos 10 quilômetros, não conseguisse uma forma de arrumar combustível. O motor já havia sido adaptado para o padrão flex (que incluía diesel, gasolina, álcool e, se as leis da física e da química tivessem permitido, até sangue humano). Mesmo assim, cada quilômetro a mais rodado estava se transformando em um pesadelo. 

Virgo checou novamente o mapa feito à mão em busca de uma solução. Desceu e subiu os óculos de motociclista, socou o volante e esfregou seu santinho enquanto pensava furiosamente em busca de uma alternativa. 

Não contava com o posto de areia destruído pelo novo “messias” da semana na região (como alguém pode achar que óleo diesel é o sague do demônio? Fala sério!) e agora estava em apuros – de novo. 

Do lado de fora, algumas crianças brincavam com a cabeça de um animal (uma vaca? Elas não eram as com chifres?) e o ex-frentista do posto permanecia prostrado na cadeira enferrujada. As marcas no rosto dele denunciavam que ele não era exatamente um adepto do tal maluco, mas que tampouco era burro e soube a hora de desistir. Pelo bem das crianças. 

O enorme tanque de refinaria não estava mais pegando fogo, mas a fumaça que entrou pelas narinas a fez chorar. E não por causa de uma irritação nas narinas. Mas chorar em tempos de seca era um desperdício tão grande quanto queimar um dos últimos depósitos de diesel da região. Era um local sagrado, com a qual nem as gangues mexiam, já que as chances de desperdiçar o pouco do líquido que havia era alto demais para valer o risco. 

E, claro, porque aquele posto pertencia aos Cacheiros, o grupo paramilitar mais bem-armado de todo o Sertão. Quase tinha pena do falastrão messiânico e seu grupo de imbecis. Quase. Mas Darwin agia certo por linhas estranhas, e ela duvidava que os cacheiros não mostrassem o inferno para os fanáticos. Mas, bem, isso era um POP – um “problema de Outra Pessoa” –, como dizia um trecho de um livro que lera uma vez. 

E o problema dela, agora, era o suficiente: combustível, energia, locomoção. Ir de A a B, mover ou morrer. Pistões ou pistolas, diria sua irmã, o fato é que uma entregadora era de pouca valia se estivesse paralisada. E os contratos deixavam claro, geralmente, que combustível, era um problema dela. 

Ficar muito tempo no mesmo lugar atrairia aves de rapina, como os Carcarás de Sangue, os Abutres do Asfalto ou os Corvos Nunca Mais. E ela não mantinha o rostinho bonito longe de encrencas dando mole. 

Quando um furgão – Deus Ex Machina – passou a toda na direção contrária, ela teve um estalo. Aquele era um carro da Refinaria: grupo de fazendeiros que conseguia produzir energia liquida do sol, plantando versões resistentes de cana-de-açúcar em imensos galpões – os sobrados – e vendendo depois. Pelos olhos da cara, ou arrancando um deles se alguém se metesse em seu caminho. 

Virgo saiu para a poeira e foi até a tenda improvisada. Lá havia algumas redes, todas vazias, e um balcão que vendia calango. Com dois torrões de açúcar e 100ml de água fez uma refeição decente enquanto pensava como usar esta informação. 

Os Cacheiros eram pagos pelos Refineiros pela segurança externa. Os melhores jagunços que o dinheiro poderia comprar. Os Cacheiros retribuíam a confiança revendendo os produtos da Refinaria a preços pouco convidativos. Uma simbiose poderosa. Quem não sabia usar armas ou pilotar, plantava. Quem não sabia plantar, usava armas. E quem não fazia nenhum dos dois, morria na estrada. 

Darwin, outra vez. 

Virgo decidiu que preferia morrer tentando (e de alergia a chumbo) a ser estuprada por meia dúzia de imbecis na areia. Ela tinha algumas armas, um carro que não era dos piores e a incrível capacidade de desaparecer por dentro dos cânions da região se o bicho pegasse. E uma caixa de placas de vídeo para entregar para meia dúzia de hackers. Uma vez sentada ao volante, ela ligou a máquina e se dirigiu à área que parecia ser da Refinaria.
(Continua em Virgo Parte 2)