segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

A evolução e morte de um sistema: As regras de Cyberpunk 2020

(Ou, porque dar tiro para tudo que é lado algumas vezes é Falha Crítica).

Mesmo para quem não joga e não deseja jogar Cyberpunk, sugiro a leitura deste texto, já que ele pode ser ilustrativo de uma idéia que defendo: Há momentos que RPGs "pedem" para ser deixados aonde estão, e a insistência de novas regras traz um risco de sujar um bom histórico de um jogo até então exemplar de sua época e modo de jogar.


Um dos principais problemas de um bom RPG é que, quando faz sucesso, ele dura muito. E quando isso ocorre, há uma tendência a se perder quando tenta se adaptar aos novos tempos. Poucos RPGs conseguem ficar bem ao longo do tempo, e a maioria só sobreviveu fazendo escolhas, algumas vezes dolorosas, para permanecer "competitivo" em um mercado que tem muita coisa boa.

O fato, moçada, é que RPGs envelhecem junto com a gente. Seja na temática, seja no role-play seja no conjunto de regras, livros de RPG fornecem ferramentas, técnicas, que dificilmente agradam a todos para sempre. Sabe aquele Pathfinder estalando de novo na sua estante? Pois é, em 10 ou 15 anos vai ser "coisa de velho". Sinto muito.
E o "Novo Mundo das Trevas", ao contrário de Vampiros das lendas, também vai ficar caduco um dia. Resta esperar que demore. A gente só pode torcer para que jogos sejam atualizados de acordo com necessidades reais dos jogadores, e não por falta de bom-senso nem motivos de mercado, simplesmente, adiantando ou pior, retardando) o final de um sistema para atingir metas.

Isso ocorreu de diferentes formas com Cyberpunk da Talsorian, e minha idéia é mostrar as diferenças entre cada versão para ilustrar isso em um terreno que conheço bem. Vou dar uma esplanada geral nas regras, e mais rápida nas ambientações. A função é mostrar o nascimento e vida util de um sistema que, amado por mim, é reconhecidamente um sistema que morreu (e vida longa aos "Remember Tomorrow" ou "Atomics Highway" da vida (a gente fala desses um dia).

Que sejam bem-vindos e produzam em muitos o prezar de jogar que cyber 2020 me proporcionou e ainda proporciona).
Melhor que sistemas-zumbis que morreram e se recusam a ir para a tumba (opinião pessoal, sem citar a que me refiro).

Então menos conversa e mais trabalho:
Ao contrário do que muitos imaginam, não existiram duas ou três versões de Cyberpunk 2020, mas cinco. E dentro disso, mais duas regras opcionais (no mínimo) foram sugeridas para dar conta de situaçoes como combate entre veículos realmente pesados (Maximum Metal) e combate massivo (Chrome Berets). Vou tentar trazer aqui os principais pontos de cada sistema de regras e uma rápida annálise do que funcionou, como foi recebido, e do que não funcionou. Sete modificações relevantes em regras para 5 ambientações não é pouca coisa.

Vamos lá (não estou nexessariamente usando a ordem cronológica dos lançamentos):

2013/ 2020: Fire Night Firefight

A não ser que você seja um leitor assíduo deste ou outros blogs, ou um veterano de cyberpunk 2020, mas o (medianamente) conhecido cyberpunk 2020 NÃO FOI a primeira versão. A primeira, chamada simplesmente de "Cyberpunk" ou pelos fãs de Cyber 2013, se passava em 2013, pouco tempo após as "Guerras Sul-Americanas", onde os EUA, apanhando feio, foi obrigado a desistir da guerra e admitir a derrota após levar um couro nas selvas amazônicas e seu país ter falido.

De plena coerência com o período, o Cyber 2013 bebia na fonte do "Movimento" [cyberpunk] e fornecia uma ampla possibilidade de cenários que permitiam aventuras com climas de filmes desde "Blade Runner" a "Mad Max".

Cyber 2020, o mais famoso e único traduzido aqui (de vez em quando a Devir acerta na tradução e infelizmente esta não foi uma dessas vezes), usava basicamente o mesmo sistema, mas com mais armas, implantes, armaduras e tecnologia.

A Arte do jogo (ja falei dela em outra postagem), com exceção da capa, sempre foi péssima, apesar de funcionar o suficiente. Até o Liefeld faria melhor (para vocês verem...).

As regras basicamente eram o seguinte, para ambas as versões:

Dois tipos de indicadores principais: ATRIBUTOS, que definiam as habilidades "inatas" dos personagens (força, destreza, etc), e as PERÍCIAS que forneciam o que poderia ser aprendido pelo personagem ao longo de sua "carreira" (atirar com rifle, artes marciais, contabilidade, etc).

Somadas ambas (cada uma ia de 1 a 10) e um d10, o resultado final era a soma de tudo, com uma dificuldade que ia de 5 (baba de quiabo) a 30 (praticamente impossível). Atributos e Parícias podiam ser melhoradas com implantes cyber, aprendizado e, nas rolagens, com pontos de Sorte, que iriam ser somados a uma dada rolagem crítica (na prática, de pouca ajuda).

A ficha era feita, como era o padrão na época, com lançamento de dados fechados. Ou seja, as rolagens definiriam os numeros do personagem, favorecendo personagens desequilibrados em uma mesa.

Lifepath: Uma história" rolada da história dos personagens pode ser encontrada com diferentes adaptações em cyberpunk, cyber 2020 e sistemas como o Cybergeneration, Cyber-vampiro, Cyber-generation e Cyberpunk V3. Por exemplo, o personagem pode ter assim definido de corte de cabelo a numero de irmão, mais ou menos dinheiro ou inimigos mortais. Quem gosta de rolagem randômica pode curtir (há boas coisas em todos eles), apesar de eu preferir fazer o histórico "por conta. Não vou detalhar isso nos outros sistemas por serem muito similares entre si. Mas nada contra.

O sistema tinha dois grandes furos:
-As perícias eram inutilmente divididas (por exemplo, uma para rifle, uma para pistola e uma para sub-metralhadora).
-O Sistema de dano, que tentava ser realista, mas tornava o combate lento demais (por exemplo, uma rajada de uma metralhadora 5d6 que acertasse 10 tiros em um alvo forçava os jogadores a rolar 10 vezes 5d6. Um saco (eu ignoro essa regra quase sempre e simplifico as coisas).

No meio disso tudo alguns suplementos traziam regras mais específicas para coisas como combate em gravidade zero ou debaixo da água, mas eram apenas maiores detalhamentos das regras já existentes.

A ambientação de Cyber 2020, segundo boatos,  foi reconhecida por um dos papas do Cyberpunk (juro que não sei se o Sterling ou o Gibson) como a mais fiel ao "movimento", o que não é pouco, ainda mais se considerarmos que "rivias" de peso como Gurps Cyberpunk e Shadowrun corriam lado a lado. Mesmo que não seja verdade, exceto pelas coisas mais novas, sou propenso a concordar (mas sou suspeito).

(Continua nos próximos dias)

Brega Presley (Aka Pedro).
Braços

22 comentários:

  1. Só para esclarecer: Isso NAO quer dizer que sistemas "Old School" não devam ser jogados. Ao contrário.
    Mas a gente deve saber a hora de deixar algo ser tratado como datado e curtir como se curtem as músicas antigas. Ou alguém acha que Disco deveria ser Hir-Parede?
    Braços

    ResponderExcluir
  2. Não sei, viu? Às vezes, com um pouco de criatividade, interesse e paixão por um cenário (nem estou falando do sistema) os jogadores conseguem atualizar as coisas com regras da casa, e os dados continuam rolando.

    Beijos ^.^

    ResponderExcluir
  3. Conduzi uma campanha média de CyberPunk 2.0.2.0., com quinze capítulos, onde fui obrigado muitas vezes a mudar as regras para tornar o jogo possível. Sem falar que ignorei completamente o capítulo a respeito de netrunners.

    De qualquer modo, o livro básico fornece muito material para ambientação, coisa que alguns suplementos se encarregam de expandir com competência (Land of the Free, Home of the Brave).

    ResponderExcluir
  4. Ótimo artigo. Os RPGs assim, como os bons romances ficam datados e este é um processo inevitável. D&D é um bom exemplo de título que foi obrigado a reinventar-se para agradar aos novos jogadores. Até hoje, há quem prefira a versão 3.X (ou mesmo a do AD&D) ao invés da atual 4.0. Aguardando os novos artigos.

    ResponderExcluir
  5. É um jogo que AINDA pode ser jogado (eu ainda mestro pacas no sistema).

    Mas em termos do que existe hoje em jogabilidade e regras, é um sistema que sobrevive pelo tesão de mestres e jogadores, e virou um "old School" (o que, para mim, é algo honroso).

    Estou sempre adaptando coisas, cenarios, relendo e vendo o que existe de outros fãs.

    Mas não é mais um jogo que consiga voltar ao mercado. Esse é o ponto. A última tentativa, Cyber 203x (ou V3 para os íntimos) afundou de vez a franquia. Tanto que a Firestorm ainda tenta reviver a cybergeneretion, a Cubicule 7 (salvo engano) ia tentar lançar um tal "Genesis Descent", e as idéias não foram para a frente.

    Ele é mantido vivo pelo carinho dos jogadores, mas não é mais um sistema vivo para fins de mercado.

    Brega

    ResponderExcluir
  6. Não acho que jogos (falando de sistema) ficam necessariamente datados. Ninguém parou de jogar xadrez, quando passaram a existir os jogos de miniaturas.

    Taí o antigo WoD, que voltou ao prelo, que não me deixa mentir.

    Admito a possibilidade de isto ocorrer para certos gêneros, quando estes gêneros deixam de ser relevantes, como, na minha opinião, cyberpunk.

    ResponderExcluir
  7. É que nem a gente tentar fazer gibi.
    Spirit hoje em dia não funcionaria, mas ainda atrai leitores apaixonados. E acabou antes de ficar realmente ruim ou datado. Ainda é lido, mas não mais editado.

    Acho que com RPGs deve existir o mesmo:podem ser eternamente jogados, mas não precisam todos serem eternamente reeditados e revistos para serem curtidos.

    ResponderExcluir
  8. Na verdade, há coisa de dois anos houve um gibi do Spirit que durou bem dois anos, se não me engano. Quem escrevia era o Sérgio Aragones.

    E no gibi estamos discutindo gênero, e não sistema.

    ResponderExcluir
  9. Sim, mas Xadrez nunca mais foi "reeditado", Igor. Com exceção de uma versão chinesa (ou japonesa) e do original "chaturanga" ou algo assim), ele quase não teve nenhuma mudança de regras.

    Imagine se alguém a cada 10 anos tentasse "reinventar " o Xadrez? Não sei se teria sobrevivido com a paixão que ainda desperta.

    Meu ponto é: Tem jogos que é melhor deixar depois de um certo ponto, como são, e curtirem sua aposentadoria com dignidade. D&D, já que foi citado, é um RPG que corre o risco de desaparecer deixando, do mesmo modo que cyber 2020 no "2030X", um último filho indigno de sua história.

    ResponderExcluir
  10. Foi uma forma de ilustrar meu ponto, Igor, Larga a mão de ser pentelho.
    :O)
    Braços.

    ResponderExcluir
  11. E durou dois anos, pouca gente se lembra (apesar de ser bom material) e não correu o risco de "matar" a franquia.
    Deixa explicar de oputro modo:
    Arquivo - X. Durou uns tres anos além da vida útil. Quando reprisam a imensa maioria dos fãs 9não falo aqui dos fanáticos) curte os primeiros anos. Depopis do 5 ou 6 ano foi ladeira abaixo.

    ResponderExcluir
  12. Durar dois anos no mercado de quadrinhos atual é muito bom.

    Não precisa explicar de outro modo, eu entendi. Só não concordo.

    E tem dezenas (centenas?) de RPGs que são jogados, apesar de serem antigos, estando ou não no prelo. A impressão que tenho é que você acha que as pessoas só jogam RPG antigo por questão de nostalgia.

    Não concordo que RPG, ou qualquer jogo, se aposenta.

    Se eventualmente surgem regras novas, que não tornam inútil o material antigo, porque se aposentar? principalmente na era digital, onde a opção do .pdf, ou mesmo de POD, está em alta?

    ResponderExcluir
  13. Não, Igor, o que estou dizendo é que há momentos que insistir na re-impressão de um jogo pode ser tolice.

    Eu jogo Cyberpunk há 20 anos. Mais datado é dificil.

    A aposentadoria não é de mesas, é de "renovãçoes" que não levam a lugar algum.

    E sim de deixar algo que já não funciona bem para todo mundo de lado e abrir espaço para coisas novas TAMBÉM.

    Se todo mundo (exemplo) só jogasse cyber 2020, o bom cybergeneration não teria surgido. Se todos jogassem cybergeneration, o bom BESM não teria tido chance, e por aí vai.

    Isso NÃO significa deixar de jogar os mais antigos, mas deixa-los envelhecerem, procurando ao mesmo tempo dividir o tempo entre os antiogos (e amados) com os novos e interessantes.

    Abraços

    ResponderExcluir
  14. "A impressão que tenho é que você acha que as pessoas só jogam RPG antigo por questão de nostalgia."

    Negativo. Jogo por prazer. Prazer este que, no caso de Cyberpunk V3 não existe. foi um RPG dispensável e ganhariamos mais, talvez, se o Mike tivesse usado as idéias que prestam em 203X para fazer algo diferente, em vez de forçar a mão para uma continuação mediocre de cyber 2020.

    Braços

    ResponderExcluir
  15. Ps: Esse tópico tá rendendo mais que eu esperava. Legal.

    ResponderExcluir
  16. Mas isso é radical demais. Ao seu Cyber 2020, eu contraponho o Cthulhu, que existe quase o mesmo há mais de 30 anos, e isto não impediu de haver mais de dez outros jogos com exatamente a mesma temática, baseados no MESMO AUTOR. Não é tolice reimprimir CoC, nem é tolice fazer as eventuais, e pequenas, mudanças de regra dele.
    Se as pessoas pensassem assim, não teríamos mais o CoC.

    ResponderExcluir
  17. Sim, mas foram bem-feitas, né Iogor.
    Imagina se começassem a fazer o monte de bobagens que fizeram com Cyber?

    O ponto de "basta" em Cyber foi NEM a Atlas, NEM a Ianus e NEM o Cybergeneration terem "funcionado". As regras reeditadas (já escrevi sobre elas, posto essa semana devagar) na verdade ram a mesma coisa piorada, a ambientação ficou terrível e se tentou inventar em cima do que funcionava como estava, sem contribuir com algo de fato bacana.

    Cthullhu (que não é só seu, sabichão), manteve o foco nos livros de Lovercraft, as regras, como as de Trail, foram feitas para fazer funcionar o que eles não achaVAM QUE FUNCIONAVA, e a coisa foi tão redonda que, no geral,mesmo com alguns que não gostaram, não houve "crise" e maiores atritos entre aodradores de Cthullhu (com trocadilho).

    Mas Cyber 2020 foi mal conduzido. E no meu entender não significa que tudo tem de ser aposentado. Mas que há momentos que isso pode ser feito sem dor na conciencia.

    D&D 4th edição é uma mostra disso. Nem vou discutir detalhes tecnicos. Mas NÃO vendeu, não rendeu o esperado, e invez de ser pensado como um RPG a ser refeito (de novo), talvez fosse mais produtivo o mercado deixar a franquia de lado (talvez no 3.5 e no Pathfinder) e ver outras coisas.

    ResponderExcluir
  18. Mechwarrior, Car wars, ou Gurps são outros exemplos. Ainda que tenha seus fãs, Gurps dificilmente retoma a majestosa atenção já um dia alcançada. E muito do filme do sistema se queimou com algumas regras motivo de piada até hoje. MESMO se a quarta edição (como o Edson defende) estiver bacana,não é um sistema que ainda tenha força, entre outras coisas porque poderia ter sido deixado de lado até ter material, se um dia existisse, que funcionasse no mercado.

    ResponderExcluir
  19. Ps: E Cthullhu Tech, ainda existe, por falar nisso?

    ResponderExcluir
  20. CthulhuTech acho que acabou, mas não estou certo.

    GURPS não volta à atenção alcançada? Brega, RPG não é só o que acontece no Brasil. Na verdade, o Brasil é, se tanto, nota de pé de página. GURPS continua tão firme quanto sempre foi. Regra motivo de piada, todo RPG tem.

    Na minha modesta opinião, a 4ed do D&D só não abafou a edição antiga, por incrível que pareça, graças ao OGL, que permitiu que a 3ed continuasse sendo publicada por terceiros.

    Agora se você está dizendo que pessoas podem estragar a popularidade de seus jogos por serem absolutamente incompetentes, neste estreito ponto, tenho que concordar. Por sorte, tem bastante gente competente trabalhando com RPG. Então acho que você não pode extrair uma regra geral daí.

    Mas eu acho que é melhor tentar melhorar, antes de desistir.

    E se eu tenho uma franquia de jogos para ganhar dinheiro, é óbvio que eu devo tentar ganhar dinheiro com isso. Se não deu, paciência.

    ResponderExcluir
  21. Não tenho visto gurps está com essa bola toda lá fora também, mas tbm voce frequenta mais fóruns que eu, então vou admitir minha "inguinorança" no assunto e aceitar sua opinião como mais acertada.
    Braços

    ResponderExcluir
  22. Deus Ex Machina: Com a proposta de um 2077, voltei a me empolgar com uma renovação do sistema, que deve vir na rebarba. Mas é o caso de algo realmente tirado da manga e que pode ou não ser interessante para o sistema.

    Continuo a achar que, grosso modo, jogos tem seus momentos e que fazer inovações só por reniovar, sem consist^encia de regras ou ambientação, como é o caso de boa parte das revisões de jogos, é pura perda de tempo.

    ResponderExcluir